Aspectos socioculturais

Aspectos políticos e sociais da Mutilação Genital Feminina

      A prática da Mutilação Genital Feminina (MGF) é sustentada por uma série de crenças que a incitam, tais como: “alegados” benefícios de saúde e higiene e motivações religiosas, de tradição, ou relacionadas com o gênero. Muitas vezes é considerada um ritual de transição para uma menina, garantindo o seu status e um futuro casamento dentro da comunidade. A decisão de mutilar a menina normalmente é tomada pelos seus pais ou outros familiares próximos. A opção de não mutilá-la muitas vezes é recebida com forte oposição da comunidade, porque a MGF é uma tradição profundamente enraizada nas estruturas sociais, econômicas e políticas.
     A MGF constitui tanto perseguição com base no gênero, como perseguição específica às crianças, de acordo com o  Manual de Procedimentos e Critérios Para a Determinação da Condição de Refugiado, do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR em português). O ACNUR é um órgão das Nações Unidas criado pela Resolução n.º 428 da Assembleia das Nações Unidas, em 14 de dezembro de 1950, tendo como missão dar apoio e proteção a refugiados de todo o mundo, sua sede está localizada em Genebra, Suíça. Geralmente, as reclamantes são mulheres ou jovens que receiam ser submetidas à prática e/ou os pais/mães das jovens que receiam ser perseguidos por oporem-se a uma norma social. Em princípio, estes também estão protegidos pela Convenção de Genebra de 1951, de acordo com o ACNUR, uma vez que a sua oposição a uma norma social discriminatória em relação às mulheres gera receio de perseguição.
      Alguns Estados-Membros da União Europeia (UE) reconheceram a MGF como forma de perseguição com base no gênero. No entanto, alguns Estados têm um entendimento limitado dos motivos para pedidos de asilo declarados na Convenção de Genebra, proporcionando assim um grau de proteção diminuto em casos relacionados com a MGF. Ainda, alguns Estados-Membros ignoram a criança na especificidade nesta forma de perseguição, uma vez que consideram as crianças incapazes de expressar receio e oposição à prática. À medida que são cada vez determinadas mais regras de proteção internacional a nível da UE, é crucial que a abordagem comum da UE ao asilo respeite os padrões internacionais. Assim sendo, deveriam ter em consideração as necessidades e os direitos das pessoas requerentes de asilo com base na MGF, tal como estabelecido nos princípios do ACNUR.       
        Os costumes e as tradições são as razões mais citadas para a MGF. O falecido Presidente do Quénia, Jomo Kenyatta, disse “a abolição...destruirá o sistema tribal”. Por estas razões, uma jovem não é considerada uma adulta numa sociedade que pratica MGF, se não se tiver sido submetida à mutilação.

Texto baseado na cartilha "FIM À MUTILAÇÃO GENITAL FEMININA: UMA ESTRATÉGIA PARA AS INSTITUIÇÕES DA UNIÃO EUROPEIA- da ''Campanha Europeia Fim à MGF'' 
http://www.endfgm.eu/content/assets/ENDFGM_summary_PORTUGUESE.pdf

Aspectos culturais da Mutilação Genital Feminina


         A Mutilação Genital Feminina (MGF) continua a ser praticada em virtude de uma alegada legitimação cultural, religiosa ou de práticas ancestrais. Esta e outras práticas tradicionais nocivas, tais como apedrejamento, queimadura com ácido, punição em praça pública, casamento forçado e/ou precoce, escravatura, tráfico e exploração sexual, constituem uma clara violação dos direitos fundamentais e afetam mulheres de todas as idades, culturas e religiões, reforçando uma desigualdade entre homens e mulheres que impede o usufruto dos direitos, garantias e liberdades dos seres humanos.
         As justificativas tanto para a prática como para a manutenção da MGF prendem-se a questões socioculturais e econômicas, podendo mesmo ter origem num símbolo de herança e identidade de um grupo étnico específico. Estas razões encontram-se intimamente ligadas à desvalorização da mulher e ao casamento como garantia de futuro. Assim, segundo as comunidades ,são numerosas as razões que conduzem à prática:
  • Preservação da virgindade da mulher até o casamento; 
  • Proteção da honra da família por garantir a legitimidade das descendências; 
  • Redução do desejo sexual da mulher tornando-a "menos promíscua", pois o clitóris é considerado um órgão masculino (sendo associado ao aumento do desejo sexual, à masculinidade, a comportamentos agressivos, e ao aumento do número de parceiros sexuais) e a sua remoção acentua a diferença anatômica entre os órgãos genitais femininos e masculinos; 
  • Aumento do prazer do homem durante o ato sexual; 
  • Aumento da higiene e estética, uma vez que os órgãos genitais femininos são considerados sujos e inestéticos; 
  • Supostos benefícios para a saúde, garantido o aumento da fertilidade das mulheres; 
  • Questões religiosas; 
  • Facilitação do parto; 
  • Promoção da coesão social; 
  • Aumento das oportunidades matrimoniais.
      Esta prática relaciona-se intimamente com questões de honra familiar e é entendida como uma garantia do papel e do estatuto que a família mantém na comunidade, bem como da própria coesão social. O corte dos genitais femininos é considerado uma prática natural para a preservação da moralidade e virgindade da jovem, e em situações de guerra ou conflito é também entendida como um meio de proteger a menina e a mulher de possíveis violações.
      É importante salientar que, em muitas sociedades, a prática deste ritual assegura às mulheres que executam a prática e às suas famílias poder econômico e um reconhecido e elevado status social. Em alguns casos estas mulheres realizam não só o ritual da excisão, mas também todos os procedimentos de preparação para o casamento, parto e pós-parto e desfibulação, sendo que cada um desses procedimentos corresponde a uma fonte de rendimentos.

Texto baseado no ''II Programa de Acção para a Eliminação da Mutilação Genital Feminina no âmbito do IV Plano Nacional para a Igualdade – Género, Cidadania e Não Discriminação (2011-2013)'' do Governo de Portugal 
http://www.cig.gov.pt/wpcontent/uploads/2013/12/II_Programa_Accao_Mutilacao_Genital_Feminina.pdf 

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